O setor de supermercados, um dos essenciais na pandemia, segue em ritmo acelerado, mas enfrentando preços em alta e, mais recentemente, falta de produtos. É nesse cenário que assume, em 1º de janeiro, a nova diretoria da Associação Catarinense de Supermercados (Acats), que tem à frente o empresário Francisco Crestani, de São Miguel do Oeste. Ele sucede Paulo Cesar Lopes, de Blumenau.
De acordo com Crestani, a tendência é de que os preços de alimentos se mantenham altos, por enquanto, porque há escassez de produtos. Ele afirma que a maior dificuldade é no setor de bebidas, com oferta 30% menor. Sobre a gestão da Acats, ele diz que a nova diretoria seguirá priorizando o uso de tecnologias digitais, uma mudança que chegou com a Covid-19. Confira a entrevista a seguir:
O senhor assume a presidência da Acats num momento em que preços de alimentos e outros itens estão em alta. Quais são as expectativas para esse cenário?
O setor supermercadista é o maior distribuidor de mercadorias do estado. Temos mais de 4 mil lojas em SC. Os supermercados são repassadores de mercadorias. Compramos e vendemos produtos, com exceção de itens de padaria e cortes de carnes. Mas, muitas vezes, tem fornecedor industrial que pratica preço abusivo. Um exemplo na pandemia foi o álcool gel.
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O consumidor quer produtos baratos, como carne, cereais e outros. Mas se forçarmos isso por muito tempo, estaremos matando o produtor, no caso do agricultor ou criador de gado. Para tudo tem que ter um meio termo. O milho está custando mais de R$ 80 por saca. Está inviável ao produtor manter isso e praticar preços baratos. Santa Catarina está com uma estiagem muito grande.
Temos que torcer para que outras regiões tenham uma super safra, para o país ter um estoque regulador de alimentos. Sem isso, vamos pagar caro ou não ter produto. Hoje, quase nenhuma indústria de óleo de soja está moendo porque não tem mais grãos. O primeiro grão que vai aparecer será em fins de janeiro no Mato Grosso. Até ser industrializado e chegar nos supermercados, vai meados de fevereiro. Antes disso não. Vamos ter, em 2021, dificuldades de preços porque nosso estoque regulador está quase zero.
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Continuaremos tendo inflação de alimentos em 2021?
Eu não vou dizer que os preços vão continuar subindo, mas a queda será muito pequena no próximo ano porque a falta de produtos está muito grande ainda. Veja toda a área de hortifrúti. No que dependermos da nossa região (Oeste de SC), não teremos oferta porque estamos sem água para produzir. É difícil. E, lá na frente, poderemos matar o produtor porque ele pode ter problemas crescentes com seca e parar de produzir.
Estamos registrando queda nos preços de carne bovina e suína junto aos produtores nas últimas semanas. Mas considerando o ano que vem, pelo preço de alimentação de frango e suíno, poderemos ter pressão de preços. Contudo, o consumidor não tem como pagar mais além dos valores praticados agora. A expectativa é de que os preços vão se manter. As quedas serão difíceis.
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Há algum tempo, o setor vem registrando algumas faltas de mercadorias. Como está esse problema?
Estamos com muita falta de mercadorias. Neste mês de dezembro, o consumidor não deverá perguntar onde a cerveja Skol está mais barata, mas qual supermercado tem essa marca. Isso porque a falta de bebidas está muito grande em função da falta de matérias-primas para industrializar. Vinícolas não estão podendo embalar espumantes por falta de embalagens. Importações que deveriam chegar no final de novembro, prometeram para o fim de janeiro.
Acreditamos que no setor de bebidas, teremos oferta 30% menor em dezembro frente ao mesmo mês de 2019. Outro detalhe: estamos com a divisa com a Argentina fechada no Oeste do estado em função do novo coronavírus. Se não abrir, nós vamos ter uma venda muito grande de bebidas nos supermercados catarinenses, especialmente vinhos e espumantes, porque cai a oferta de mercadoria ilegal. Nós também enfrentamos menor oferta de outros alimentos, também por falta de insumos no processo de produção.
Quanto o setor deve crescer em 2020 e qual é a projeção para 2021?
A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) está projetando para este ano crescimento real em torno de 10%, média que deve ser registrada também em SC. Não chegamos a esse crescimento ainda, mas como o nosso dezembro sempre é forte, acredito que chegaremos lá. Para 2021, a estimativa da Abras é de crescimento de 4% a 5%, mas não sei se chegaremos a isso.
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O setor tem investido alto e constantemente em novas lojas em SC. Isso vai continuar?
Sim. O setor tem investido muito. Não temos ainda um levantamento sobre os valores deste ano. No ano que vem os novos projetos continuam porque a concorrência é grande. Quando uma loja investe, as outras também fazem o mesmo para se modernizar, não perder clientes. Além disso, existe a necessidade de modernização de lojas. Você investe em supermercado e cinco anos depois já precisa começar a renovar equipamentos, especialmente em informática e refrigeração.
O que a nova diretoria da Acats, liderada pelo senhor, vai priorizar nos próximos dois anos?
O que a gente vai priorizar hoje é uma coisa. Depois pode mudar. Quando o atual presidente, Paulo Cesar Lopes assumiu, não tinha nada sobre Covid-19. Aí chegou a pandemia e 90% da força da entidade foi para enfrentar esse problema. Vamos tentar incrementar tudo o que temos na Acats e vamos adotar novas tecnologias na gestão. Um exemplo: todas reuniões da Acats eram presenciais e, com o novo coronavírus, passaram a ser feitas todas on-line.
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Vamos continuar com reuniões on-line e passamos a oferecer também cursos a distância. Temos sete comitês na Acats que faziam reuniões presenciais. Agora são todas digitais e muito mais empresas podem participar. Fizemos a primeira ExpSuper on-line em outubro. Podemos voltar a fazer presencial, mas podemos ter feiras digitais regionais. O próximo ano será de mudanças.
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Será o ano da mudança sobre como buscar informações, sobre como participar das reuniões. Para se ter ideia, para nós, de São Miguel do Oeste, participarmos de reunião em Florianópolis, temos que ir num dia e retornar no outro se a reunião é de manhã. Se é de tarde, gastamos três dias.
Hoje, se é uma reunião de 2 horas, esse é o tempo que gasto para uma reunião on-line da Acats. Mesmo que as vacinas sejam eficazes para evitar a Covid-19, acredito que será impossível a gente voltar a ter apenas reuniões presenciais. Hoje, temos reuniões de um comitê sobre perdas em supermercados que contavam com 20 pessoas. Se for on-line, podemos ter 300 pessoas.
Antes, os melhores cursos eram feitos em Florianópolis. Agora, todo o estado pode participar. Hoje, 99% das empresas supermercadistas são familiares. Criamos um comitê sobre sucessão empresarial para discutir esse tema.
As vendas virtuais cresceram na pandemia. Qual será a tendência quando esse problema passar?
A pandemia fez aquele idoso consciente ficar em casa e pedir entrega de produtos de supermercados. Tinha empresa do setor que não fazia entrega e passou a fazer em função da Covid-19. Quem está fazendo trabalho bem feito, agradando o consumidor, continuará tendo sucesso nas vendas digitais com entrega a domicílio, mas quando o problema passar, o próprio idoso voltará a frequentar mais supermercados.
Para o futuro, acreditamos que os supermercados serão mais competitivos para entregas dos produtos com os quais atuam. Nós temos mais de 4 mil lojas em Santa Catarina. Somos os grandes distribuidores de produtos. Se a indústria quiser fazer isso diretamente, vai ficar mais caro.
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Entre os desafios apontados para a economia brasileira ter uma retomada consistente de crescimento estão a realização de reformas. Na sua opinião, quais são as reformas prioritárias?
São aquelas que os políticos prometem e nunca cumprem. Primeira coisa: precisamos ajustar a carga tributária dos estados. Temos substituição tributária no Rio Grande do Sul, aqui em SC temos alíquota de 17% e no Paraná, alíquota de 25%. Seria bom uma alíquota padrão para todo o Brasil e, depois, acertar a carga tributária. Hoje, está muito difícil ser empresário. Também é necessário que os órgãos públicos atrapalhem menos os investimentos.
Só para dar um exemplo: se eu soubesse todas as dificuldades que teria para abrir a nossa última loja, eu não teria realizado o projeto. Está impossível cumprir a atual legislação.
Por Estela Benetti
“A falta de produtos está muito grande”, diz novo presidente da Acats (Foto: Pixabay)
DIARIO CATARINENSE